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Doenças causadas por Xylella fastidiosa
Daniela Figueira, Carlote Santos, Sara Rodrigues e Eva Garcia
Laboratório de Fitossanidade – Instituto Pedro Nunes
Xylella fastidiosa é uma bactéria nociva com ampla distribuição no continente americano e europeu (Figura 1), responsável por diversas doenças relevantes em inúmeras espécies de plantas de grande importância económica (EPPO, 2019). É um organismo regulado de quarentena de acordo com a Organização Europeia e Mediterrânica de Proteção das Plantas (EPPO) inserido na lista A2 da EPPO (pontualmente presentes no território EPPO e sob controlo oficial). Relativamente à União Europeia, encontra-se incluído no Anexo IIB da Diretiva 2000/29/CE do Conselho de 8 de maio de 2000.
De acordo com a bibliografia mais recente, estão descritos mais de 600 hospedeiros confirmados (EFSA, 2023). O nome atribuído às doenças causadas por este agente patogénico está relacionado com o hospedeiro infetado, e.g.: síndrome do declínio rápido das oliveiras, doença de Pierce nas videiras, clorose variegada dos citrinos, phony peach disease nos pessegueiros e a doença da queimadura das folhas nas amendoeiras, entre outras (DGAV, 2021).
Figura 1. Distribuição geográfica da Xylella fastidiosa. EPPO Global database, 2023
A bactéria coloniza os vasos xilémicos de plantas hospedeiras e a sua disseminação natural é mediada por insetos vetores que se alimentam do xilema de plantas infetadas. Qualquer espécie de inseto que se alimenta do xilema pode ser considerada um potencial vetor, sendo que um dos mais relevantes é o Philaenus spumarius, amplamente distribuído em Portugal e na bacia mediterrânica, tendo sido descrito como sendo um vetor eficaz (EPPO, 2019). A longas distâncias, a comercialização de plantas infetadas é o principal fator de dispersão da bactéria. O risco de introdução e disseminação na região EPPO é considerado elevado devido à importação e circulação de material de propagação proveniente de diferentes regiões na União Europeia, bem como às frequentes infeções latentes (assintomáticas) que dificultam a deteção precoce e à presença de espécies de insetos capazes de disseminar a bactéria (EFSA, 2020).
A espécie X. fastidiosa, está divida em subespécies, sendo que quatro já foram detetadas na europa: X. fastidiosa subsp. fastidiosa, X. fastidiosa subsp. multiplex, X. fastidiosa subsp. pauca, X. fastidiosa subsp. sandyi. Existem outras subespécies propostas que carecem de confirmação, como é o caso da X. fastidiosa subsp. tashke e de X. fastidiosa subsp. morus (DGAV, 2021).
A presença da bactéria foi confirmada pela primeira vez na Europa em 2013, no sul de Itália, na região da Apúlia. A subespécie pauca foi identificada como responsável pela devastação de uma grande área de olivais e pelo impacto em várias plantas ornamentais. Desde 2015, têm sido identificados vários focos na União Europeia: Córsega em julho de 2015, região de Provence-Alpes-Côte d'Azur no continente francês em outubro de 2015, Saxônia na Alemanha em junho de 2016, Ilhas Baleares em novembro de 2016, Valencia em junho de 2017, região de Madrid em abril de 2018 e Monte Argentário, Toscana, Itália em dezembro de 2018.
Em janeiro de 2019, foi assinalada pela primeira vez a presença de X. fastidiosa susp. multiplex no concelho de Vila Nova de Gaia. Em Portugal existem vários focos da doença ativos (DGAV, 2023), com especial preocupação em espécies hospedeiras com interesse económico como a videira, oliveira, amendoeira, pessegueiro, laranjeira, lavanda, entre outras (DGAV, 2021). À data de 19.06.2023, estão demarcadas 10 zonas em território nacional: Zona Demarcada (ZD) da Área Metropolitana do Porto, ZD de Bougado (concelho da Trofa), ZD da Covilhã, ZD do Fundão, ZD de Gândaras (Conselho da Lousã), ZD de Marrazes e ZD de Monte Redondo (conselho de Leiria), ZD de Penamacor, ZD da Área Metropolitana de Lisboa, ZD de Colares (conselho de Sintra) e ZD de Palmela (DGAV,2021). A susp. fastidiosa foi, entretanto, também detetada em território nacional.
Na região da Cova da Beira, foi detetado um foco em amendoeiras colhidas em Alcaria no Fundão (Despacho nº 87/G/2022, 2022). Até à data, a cerejeira ainda não foi incluída na lista de hospedeiros de X. fastidiosa detetados em Portugal (DGAV, 2023).
SINTOMATOLOGIA DA DOENÇA
A colonização do hospedeiro pela bactéria ocorre frequentemente de forma comensal e assintomática. Em hospedeiros mais suscetíveis a sintomatologia observada pode variar de acordo com a espécie vegetal infetada e com a subespécie presente (EPPO, 2019).
No geral, os sintomas observados assemelham-se aos sintomas de falta de água e carências nutricionais (Figura 2). Os mais frequentes são: manchas necróticas em folhas adultas ou em ramos isolados, murchidão das folhas, queimaduras foliares e manchas cloróticas amareladas de bordos irregulares, que podem conduzir à morte da planta (EPPO, 2019).
Figura 2. Exemplos de sintomas observados em plantas infetadas por Xylella fastidiosa: A. Sintomas da Doença de Pierce em folhas de videira; B.: Sintomas da “phony peach disease”, em folhas de pessegueiros; C. Sintomas da doença do Declínio rápido da oliveira, em folhas de oliveira; D. Sintomas da “almond leaf scorch disease”, em folhas de amendoeira. Acedido em: https://gd.eppo.int/taxon/XYLEFA/photos
EPIDEMIOLOGIA
A dispersão natural de X. fastidiosa é mediada por insetos vetores, que apesar de apenas se deslocarem em voos de curtas distâncias podem ser transportados a longas distâncias pelo vento ou em plantas/partes de plantas comercializadas entre diferentes locais (EPPO, 2023).
O inseto adquire a bactéria ao alimentar-se no xilema de plantas infetadas, e esta multiplica-se e coloniza a zona inicial do seu trato digestivo (zona utilizada para captação do alimento nas plantas) (Rapicavoli et al, 2017).
O inseto vetor infetado, desloca-se para outras plantas, e ao alimentar-se transmite a bactéria para os tecidos xilémicos da planta hospedeira, infetando-a. Após a infeção, consoante o hospedeiro e subespécie presente, pode colonizar a planta de forma comensal, ou multiplicar-se e invadir os tecidos da planta, obstruindo os vasos do xilema, provocando um interrupção do fornecimento de água e sais minerais às partes superiores da planta (copa), promovendo o aparecimento de sintomas maioritariamente nas folhas semelhantes aos do stress hídrico ou carências nutricionais, podendo mesmo levar à morte da planta (Rapicavoli et al, 2017).
Figura 3. Ciclo epidemiológico da doença causada pela Xylella fastidiosa (adaptado de Rapicavoli et al, 2017).
MITIGAÇÃO E CONTROLO
Não existem tratamentos eficazes para controlo da doença, pelo que a principal estratégia consiste na adoção de medidas que previnam a sua introdução e disseminação em áreas isentas. Entre estas estão a imposição de medidas fitossanitárias rigorosas e a inspeção de plantas potencialmente hospedeiras, importadas ou presentes em pomares e viveiros. Esta inspeção permite detetar com eficácia novos focos de infeção para que medidas de mitigação possam ser implementadas que previnam a sua disseminação (EPPO, 2023).
Após a introdução da bactéria, para além da irradicação das plantas infetadas, a única medida eficaz é o controlo de população do inseto vetor, com a aplicação de inseticidas (Rapicavoli et al, 2017).
Apesar dos esforços, não foi possível até á data promover a erradicação da doença uma vez estabelecida, isto é, havendo disseminação natural (EPPO, 2023).
BIBLIOGRAFIA
EFSA. (2023). Scientific Report: Update of the Xylella spp. host plant database – systematic literature search up to 30 June 2022. EFSA Journal, 21(1), 7726.
EPPO. (2019). Diagnostics. PM 7/24 (4) Xylella fastidiosa. EPPO Bulletin, 49(2), 175-227.
EPPO. (2022). EPPO Standards. EPPO A1 and A2 Lists of pests recommended for regulation as quarentine pests. PM 1/2 (31). Disponível online em https://gd.eppo.int/standards/PM1/.
EPPO (2023) Xylella fastidiosa. EPPO datasheets on pests recommended for regulation. Disponível online em https://gd.eppo.int (accessed 2023-02-14).
DGAV. (2021). Plano de contingência. Xylella fastidiosa e seus vetores. Disponível online em https://www.dgav.pt/plantas/conteudo/sanidade-vegetal/inspecao-fitossanitaria/planos-fitossanitarios/
Despacho nº 87/G/2022, de 6 de dezembro – Actualização da zona demarcada do Fundão para Xylella fastidiosa. Direção Geral de Agricultura e Veterinária, Lisboa.
DGAV. (2023). Xylella fastidiosa. Zonas demarcadas de Xylella fastidiosa em Portugal. Disponível online: https://www.dgav.pt/plantas/conteudo/sanidade-vegetal/inspecao-fitossanitaria/informacao-fitossanitaria/xylella-fastidiosa/
Rapicavoli, J.; Ingel, B.; Blanco-Ulate, B.; Cantu, D.; Roper, C. (2017). Xylella fastidiosa: an examination of a re-emerging plant pathogen. Molecular Plant Pathology, Vol.19(4). https://bsppjournals.onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1111/mpp.12585
REFERENCIA DO CICLO EPIDEMIOLÓGICO:
Sintomas: eppo
Inseto: https://en.wikipedia.org/wiki/Philaenus_spumarius
Esquema vasos: (Rapicavoli et al, 2017)
Olival: https://acientistaagricola.pt/cultura-oliveira/