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CONTEÚDOS
Caracterização de variedades de marmelo com recurso a marcadores moleculares
Pedrosa 2023
Caracterização físico-química e nutricional do marmelo
Vasconcelos et al. 2023
Caracterização de variedades de marmelo com recurso a marcadores moleculares
Ana Pedrosa
Laboratório de Biotecnologia Vegetal, CFE - Universidade de Coimbra
O marmeleiro (Cydonia oblonga Mill.) é uma fruteira com grande relevância económica, pertencente à família Rosaceae. Nativa da região do sudoeste asiático, a espécie pode encontrar-se distribuída um pouco por todo o mundo, se as condições ao seu crescimento forem favoráveis (Rather et al., 2020). Neste sentido, possui distribui-se preferencialmente em zonas de climas temperados, caracterizadas por verões secos e quentes e invernos rigorosos. Possui um porte arbóreo de tamanho médio e uma copa irregular com ramos jovens tortuosos e flexíveis.
A resistência e durabilidade das estacas do marmeleiro são características muito relevantes que levam à sua vasta aplicação como porta-enxertos (Figura 1) em espécies da mesma família, tais como a macieira (Malus sp.) e a pereira (Pyrus sp.) (Yamamoto et al., 2004). O seu cultivo é feito principalmente para produção de fruta (marmelo), mas uma vez que a sua acidez, dureza e adstringência não são características atrativas para o seu consumo em cru é predominantemente usado como subproduto (pectina) na indústria alimentar (confeção de marmelada, geleia licores) (Güney et al., 2019).
Figura 1. Principais aplicações do marmeleiro: indústria alimentar como subproduto, indústria farmacêutica e como porta-enxerto para espécies da mesma família.
O marmelo possui um tom amarelo-dourado peculiar e um formato robusto (Figura 2), mas variável entre cultivares e variedades. Para além disto, é um fruto com muitas propriedades benéficas e uma importante fonte de minerais como o magnésio, o cálcio, o potássio e o fósforo (Lopes et al., 2018).
Figura 2. Exemplos de marmelos da variedade ‘espanhola’, em fase final de maturação, (pomar na locadlidade de Enxabarda, Castelo Branco, Portugal).
A CULTURA DO MARMELEIRO NA REGIÃO DA BEIRA INTERIOR
Em termos de produção, o marmeleiro é cultivado em mais de 50 países e apesar de se observar uma tendência positiva para o crescimento da sua produção, em Portugal é cultivado principalmente por pequenos produtores.
Apesar da existência de um leque diversificado de variedades descritas e incluídas em catálogos de variedades, as mais frequentemente identificadas pelos produtores na Beira Interior, incluem as variedades ‘Galega’, ‘Portugal’, ‘Espanhola’, ‘Champion’ e ‘Gigante de Vranja’ (Figura 3 e Figura 4). De uma forma geral, estas variedades distinguem-se, quer em termos da sua fenologia e morfologia dos frutos, quer pelas propriedades organoléticas dos mesmos.
No entanto, persistem ainda algumas dúvidas na distinção varietal em produção, sendo o seu esclarecimento possível através da análise genética dessas variedades com recurso a marcadores moleculares. Neste contexto, um dos pilares do trabalho realizado tem incidido na identificação e caraterização deste recurso endógeno com relevância e potencial de expansão na região da Beira Interior, através de marcadores moleculares. O desenvolvimento e aplicação deste tipo de ferramentas para as variedades de marmeleiro em produção consiste num imprescindível auxiliar na autentificação de germoplasma e de auxílio na tomada de decisões em futuros programas de melhoramento.
Figura 3. Diferentes variedades de marmelos em produção na região da Beira Interior.
Figura 4. Locais de recolha das variedades analisadas através de marcadores moleculares.
CARACTERIZAÇÃO DE RECURSOS ENDÓGENOS COM RECURSO A MARCADORES MOLECULARES
Os marcadores moleculares de DNA podem auxiliar na seleção de características complexas, como polimorfismos. No caso em estudo, foram utilizados marcadores do tipo SSR (sequências simples repetitivas) ou microssatélites. Estes marcadores codominantes são constituídos por repetições de cadeia curta contendo entre 1 e 6 bases nucleotídicas. A intercalação destas repetições na cadeia de DNA de cada indivíduo, torna-as muito úteis e práticas na identificação e caracterização de indivíduos em variados estudos que vão desde a análise varietal a estudos de genética de populações (Figura 5).
Figura 5. Diferentes níveis de caracterização de um recurso (morfológica, bioquímica, genética) com o objetivo de proporcionar uma avaliação completa de uma seleção de indivíduos e potenciar a valorização e conservação do recurso.
Figura 6. Técnica de reação em cadeia da polimerase (PCR). Através do uso de uma DNA polimerase termoestável e primers específicos para a região de interesse de ADN, haverá a formação múltiplas cópias de uma região específica de ADN. Este processo ocorre de forma cíclica, com uma série de oscilações de temperatura e é usualmente utilizada para fingerprinting.
O trabalho realizado com o marmeleiro iniciou-se através da recolha do material vegetal, folhas jovens de árvores selecioanadas, em diversos locais georreferenciados (Fig. 4), seguindo-se o seu processamento com extração de DNA genómico. Posteriormente, realizaram-se reações em cadeia da polimerase (Polimerase Chain Reaction, PCR) (Fig 6.), nas quais regiões específicas na molécula de DNA de cada indivíduo foram amplificadas com recurso a primers correspondentes aos marcadores moleculares SSR selecionados. A validação inicial de um conjunto de marcadores do tipo SSR irá possibilitar a análise da diversidade genética de plantas de Cydonia oblonga selecionadas, e assim, contribuir para a construção de programas de melhoramento genético, de conservação e de valorização deste recurso.
BIBLIOGRAFIA
Güney, M., Kafkas, S., Koç A., Servet, A., Keles, H., Karci, H. (2019). Characterization of quince (Cydonia oblonga Mill.) accessions by simple sequence repeat markers. Turkish Journal of Agriculture and Forestry, 43(1), 69-79.
Lopes, M., Sanches A., Souza K., Silva E. (2018) Quince – Cydonia oblonga. In: Rodrigues, S., Silva, E., Brito, E. (eds) Exotic fruits. Academic Press, Amsterdam, 363-368.
Rather, G., Bhat, M., Sana, S., Ali, A., Gul, M., Nanda, A., and Hassan, M. (2020). Quince. In: Antioxidants in fruits: Properties and health benefits, 397-416.
Yamamoto T., Kimura, T.J., Soejima, T., Sanada, T., Ban, Y., Hayashi, T. (2004). Identification of quince varieties using SSR marker developed from pear and apple. Breed Sci, 54, 239-244.
Caracterização físico-química e nutricional do marmelo
Vanessa Vasconcelos1, Guido Lopes1, Marlene Mota1, Helena Beato1, Ana Martins1, Alexandra Camelo1, Ana Rodrigues1, Pitacas, Inês2, António Rodrigues2,3, Mafalda Resende1, Mário Cristóvão 1, Luísa Paulo1, Christophe Espírito Santos1,4
1CATAA - Associação Centro de Apoio Tecnológico Agro-Alimentar de Castelo Branco, Castelo Branco; 2Escola Superior Agrária do Instituto Politécnico de Castelo Branco, Castelo Branco; 3CERNAS-IPCB, Castelo Branco, Castelo Branco; 4CFE - Centro de Ecologia Funcional, Departamento de Ciências da Vida, Universidade de Coimbra
O marmelo (Cydonia oblonga) fruto da época de outono do marmeleiro é composto por 91% de polpa, 5% de sementes e 4% de casca (Veloso et al. 2020). A polpa do marmelo é amarelada, dura, ácida e adstringente, pois contém pectinas, taninos e mucilagens. Devido à sua adstringência, normalmente, o marmelo não é consumido em fresco. Dessa forma, é utilizado na preparação de compotas, geleias, bolos e marmelada, como ilustra o Quadro 1 (Legua et al., 2013; Ashraf et al., 2016; Mir et al., 2016; Regato et al. 2017).
Quadro 1. Ilustração da composição, consumo do marmelo e algumas características do marmelo e marmeleiro.
O marmelo é uma fonte de compostos fenólicos e de ácidos orgânicos, é rico em ácido ascórbico (vitamina C), fibras e minerais, destacando-se o potássio, cálcio e fósforo. Além de apresentar elevado teor de água, exibe baixo teor calórico, é pobre em proteína e gordura (Silva et al., 2005; Legua et al., 2013; Gironés-Vilaplana et al., 2014; Veloso et al. 2020).
O consumo do marmelo confere benefícios à saúde devido às suas características nutricionais, por exemplo, o marmelo é rico em compostos fenólicos, que apresentam propriedades antioxidantes, anti-inflamatórias, antimicrobianas, anti-ulcerativas e anti- carcinogénicas (Zhang et al., 2019). A ingestão de frutas com elevado teor de compostos fenólicos pode prevenir doenças degenerativas (Legua et al., 2013). Além disso, as pectinas e fibras solúveis presentes no marmelo podem contribuir na regularização do trânsito intestinal e na prevenção de úlceras. Dessa forma, o consumo de marmelo tem, aparentemente, um efeito protetor sobre inflamações, dermatites atópicas, úlceras e cancro (Veloso et al. 2020).
Apesar dos benefícios que o consumo do marmelo confere à saúde e a facilidade de cultivo do marmeleiro, que é resistente a condições meteorológicas (ou climáticas) adversas, a produção do marmelo é muitas vezes descuidada e pouco valorizada.
DESAFIO: “ANÁLISE NUTRICIONAL E FÍSICO-QUÍMICA DO MARMELO DA REGIÃO DA COVA DA BEIRA: SEMELHANÇAS, DIFERENÇAS E PARTICULARIDADES”
No intuito de valorizar o marmelo, o objetivo deste estudo foi proceder à caracterização físico-química e nutricional de marmelos da região da Cova da Beira, verificando como se diferenciam as variedades cultivadas em distintos pontos da região e em diferentes anos de produção.
Três cultivares de marmelo (Gigante de Vranja, Portugal e Galega) colhidos no ano de 2020 e 2021 na região da Cova da Beira (2 locais distintos) foram objeto de estudo neste trabalho. A Figura 1 exibe os pontos de colheita dos marmelos.
Figura 1. Pontos de colheita dos marmelos.
Na Figura 2, encontram-se representados os marmelos colhidos e os respetivos marmeleiros, no total foram recolhidas quatro amostras em cada ano, incluindo três cultivares.
Figura 2. Amostragem dos marmelos e respetivos marmeleiros.
Como ilustrado na Figura 3, em relação à análise nutricional avaliou-se humidade, proteína, gordura, cinzas, fibra, açúcares e minerais. Considerando a qualidade/físico-química, determinou-se peso, calibre, cor (CIE L*a*b*), textura, sólidos solúveis totais (SST), pH e acidez.
Figura 3. Cronograma da metodologia aplicada às diferentes variedades.
No geral, os marmelos da Cova da Beira são compostos principalmente por água, apresentam baixos teores de fibra e cinzas, como mostrado na Figura 4. Em relação, ao perfil de açúcares, o maioritário é a frutose, seguido da glucose e sacarose.
Figura 4. Análise nutricional dos marmelos da região da Cova da Beira.
Em relação aos parâmetros de qualidade, no geral, o calibre e o peso aumentaram em 2021. Nos dois anos estudados, as cultivares Gigante de Vranja e Galega apresentaram os maiores e os menores pesos, respetivamente. A cultivar Gigante de Granja também exibiu o maior calibre enquanto a Portugal o menor. O pH pouco variou em função dos anos e cultivares. Considerando, os SST, a cultivar Galega mostrou os maiores valores e a Gigante de Vranja os menores nos dois anos de estudo.
A maioria dos parâmetros analisados apresentaram diferenças significativas consoante a variedade, o local e o ano de cultivo. A análise de componentes principais permitiu destacar a composição em minerais bem como o teor e perfil de açúcares como parâmetros diferenciadores.
CONCLUSÃO
O estudo mostrou que o marmelo da Cova da Beira apresenta variabilidade em termos de composição dependendo da variedade, do local e do ano de cultivo, que podem ser exploradas para o desenvolvimento de novos produtos, valorizando um recurso da região.
AGRADECIMENTOS
Iniciativa cofinanciada pelo Centro 2020, pelo Portugal 2020 e pela União Europeia através do FEDER. Município do Sabugal. Município do Sabugal.
BIBLIOGRAFIA
Ashraf, M. U., Muhammad, G., Hussain, M. A., Bukhari, S. N.A. (2016). Cydonia oblonga M., A Medicinal plant rich in phytonutrients for pharmaceuticals. Frontiers in pharmacology, 7, 163. https://doi.org/10.3389/fphar.2016.00163.
Gironés-Vilaplana, A., Baenas, N., Villaño, D., Moreno, D. A. (2014). Iberian-American fruits rich in bioactive phytochemicals for nutrition and health. LIMENCOP SL: Alicante, Spain.
Legua, P., Serrano, M., Melgarejo, P., Valero, D., Martínez, J. J., Martínez, R., Hernández, F. (2013). Quality parameters, biocompounds and antioxidant activity in fruits of nine quince (Cydonia oblonga Miller) accessions. Scientia Horticulturae, 154, 61-65. https://doi.org/10.1016/j.scienta.2013.02.017.
Mir, S. A., Wani, S. M., Wani, T. A., Ahmad, M., Gani, A., Masoodi, F. A., Nazir, A. (2016). Comparative evaluation of the proximate composition and antioxidant properties of processed products of quince (Cydonia oblonga Miller). International Food Research Journal, 23 (2), 816-821.
Regato, M. D., Guerreiro, I. M., Regato, J. M. (2017). A cultura do marmeleiro no Alentejo. Voz do Campo. N. º 203
Silva, B. M., Andrade, P. B., Martins, R. C., Valentão, P., Ferreres, F., Seabra, R. M., Ferreira, M. A. (2005). Quince (Cydonia oblonga Miller) fruit characterization using principal component analysis. Journal of Agricultural and Food Chemistry, 53 (1), 111- 122. http://doi.org/10.1021/jf040321k.
Veloso, A., Sousa, R., Sempiterno, C. (2020). Mineral composition of the fruits of five quince cultivars in the Portuguese region of Alcobaça. Revista de Ciências Agrárias (Portugal), 43 (2), 220-230. http://dx.doi.org/10.19084/rca.20025.