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CONTEÚDOS
O impacto das alterações climáticas na esteva
Ribeiro et al. 2023
A subespécie sulcatus da esteva: um táxon em risco?
Ribeiro et al. 2023
Ensaio de proveniências da esteva para seleção e melhoramento genético
Ribeiro et al. 2023
Propagação in vitro de Cistus ladanifer L.
Coelho et al. 2023
Sementes de esteva: de alimento ancestral a ingrediente sustentável
Frazão et al. 2023
O impacto das alterações climáticas na esteva
Maria Margarida Ribeiro (mataide@ipcb.pt), Alice Almeida, Natália Roque e Paulo Fernandez
Escola Superior Agrária do Instituto Politécnico de Castelo Branco
As alterações climáticas na região do Mediterrâneo
A região do Mediterrâneo sofrerá, no futuro, com as alterações climáticas de forma mais intensa por comparação com as outras regiões do mundo e o padrão climático mediterrânico prevalece na área de estudo do projeto CULTIVAR. A esteva, uma espécie bem-adaptada à seca e às altas temperaturas do verão, foi estudada para se desvendar as adaptações futuras e passadas às mudanças climáticas considerando toda a sua área de distribuição. Este tipo de estudos, o uso de modelos de distribuição de espécies (SDMs) em toda a área de uma espécie, para prever mudanças na sua distribuição no passado, presente e futuro, raramente foram feitos para a região mediterrânica.
Este trabalho pretende contribuir para revelar o impacto das alterações climáticas, no futuro, para uma espécie bem-adaptada aos matagais esclerófitos perenes. Além disso, a resposta da espécie às mudanças climáticas no passado foi estudada para ajudar a entender a localização de possíveis refúgios e as alterações à área de ocupação, incluindo potenciais migrações. A área de distribuição das espécies diminuirá no futuro, particularmente no cenário mais gravoso. A região do Mediterrâneo é propensa a uma maior desertificação nos tempos vindouros e este estudo pode alertar os políticos a considerar medidas para mitigar o impacto das alterações climáticas e estabelecer programas de conservação da biodiversidade.
A esteva (Cistus ladanifer) é um arbusto perene, esclerófito, de folhas resinosas devido à produção de láudano (Figura 1). A espécie ocorre associada ao sub-bosque de carvalhais ou de pinheiros e tende a dominar matagais perturbados e de baixa biodiversidade. Esta espécie está bem-adaptada a locais quentes e secos, o que pode indicar resistência às alterações climáticas, que começam a aumentar a aridez da bacia do Mediterrâneo.
Figura 1. Aspetos da esteva em flor.
Objetivos do projeto
Usando modelos de distribuição de espécies (SDMs) pretendeu-se (1) prever a distribuição atual potencial da esteva, (2) identificar as áreas mais adequadas e os potenciais refúgios glaciares para esta espécie em três períodos passados, com base na modelação, na filogeografia e em dados fósseis, e (3) projetar o modelo em períodos futuros, analisando o efeito das mudanças climáticas nas alterações à distribuição atual.
MÉTODOS
Os métodos empregues estão representados graficamente na Figura 2. Foram usadas 2833 ocorrências da espécie na modelação. Os algoritmos empregues foram: dois com uma base de regressão linear, Generalized Linear Model (GLM) e Multivariate Adaptive Regression Splines (MARS), e dois, com base em inteligência artificial, MaxEnt e Artificial Neural Networks (ANN). As variáveis ecológicas empregues na modelação foram retiradas do Worldclim v1.4, exceto os dados para o Último Glacial Máximo (LGM ~22,000 BP - anos antes do presente), que foram descarregados da plataforma CHELSA v1.2. Metade das seis variáveis ecológicas selecionadas são dependentes da temperatura e a outra metade da precipitação.
Os horizontes de tempo usados foram o Último Interglacial (LIG: ~ 120.000 - 140.000 BP), o Último Glacial Máximo (LGM ~22,000 BP), o Holocénico Médio (HM: ~ 6.000 BP - anos antes do presente), o presente e o futuro. No futuro foram consideradas duas datas (2050 e 2070) e dois cenários de aquecimento global, um menos gravoso (RCP 4.5) e outro mais gravoso (RCP 8.5). Foram, ainda, usados dois modelos de circulação global (GCMs), o CCSM4 (Community Climate System Model 4.0) e o MRI-CGCM3 (Meteorological Research Institute-Coupled Global Climate Model 3.0).
Foi produzido um modelo conjunto (ensemble) com base nos quatro algoritmos. Os dados foram analisados com o Biomod2 na plataforma R. Os dados paleobotânicos e genéticos foram retirados da plataforma Neotoma Paleoecology Database e da literatura (Quintela-Sabarís et al., 2011; Quintela-Sabarís et al., 2012), respetivamente.
Figura 2. Síntese gráfica dos métodos empregues no trabalho [adaptado de Almeida et al.,(2023)].
RESULTADOS
Área de distribuição potencial atual
As variáveis de precipitação, as precipitações do trimestre mais quente (BIO18), do mês mais seco (BIO14) e do trimestre mais seco (BIO17), tiveram importância decrescente no modelo de conjunto (ensemble), seguidas pelas variáveis de temperatura, a temperatura média do trimestre mais quente (BIO10), a máxima do mês mais quente (BIO5) e a média anual (BIO1). Além disso, na área de estudo, todos os cenários futuros preveem um aumento de temperatura (BIO1, BIO5 e BIO10), e uma diminuição da precipitação (BIO14, BIO17 e BIO18).
As variáveis relacionadas com a temperatura tiveram uma redução do LIG para o LGM e um aumento do LGM para o presente. As da precipitação, por outro lado, tiveram um aumento do passado para o presente e esses resultados foram consistentes em ambos os GCMs. O modelo conjunto (ensemble) (Figura 3A) teve maior precisão preditiva e forneceu previsões mais robustas do que os três algoritmos (GLM, MaxEnt e MARS), mas não quando comparado com as Redes Neurais Artificiais.
Figura 3. Mudanças na área de distribuição entre os algoritmos, períodos de tempo e cenários [adaptado de Almeida et al., (2023)]
A probabilidade média-alta de ocorrência da espécie (> 0,6) acontece maioritariamente na área nativa da espécie, centro e sudoeste da Península Ibérica (PI), norte de Marrocos e Argélia e nas condições atuais, por comparação com os outros cenários (Figura 3B).
Figura 4. Mapas binários: presença = verde-escuro e ausência =cinza. A. LIG, B. LGM, C. MH, D. Presente, E. RCP 4.5 2050, F. RCP 4.5 2070, G. RCP 8.5 2050, H, RCP 8.5 2070.
Existe uma boa correspondência na PI entre duas divisões, uma bioclimatológica e outra litológica, e a distribuição potencial das espécies. Existe uma divisão litológica significativa entre substratos ácidos ocidentais e básicos orientais (ver Figura 1 em Buira et al., (2021)). A outra divisão deve-se ao clima temperado a norte e a noroeste da PI (os Pirenéus e a Cordilheira Cantábrica). Essas duas divisões enquadram a distribuição potencial de C. ladanifer, orientada para o sul e para o oeste, evitando solos básicos e clima temperado (Figura 4D).
Evolução futura da área geográfica
De acordo com os resultados, no cenário de emissões moderadas, a área potencialmente adequada diminuirá em 2050 e em 2070, porém, no cenário de emissões mais altas, a área apta terá uma redução significativa em 2070 em relação ao presente (Figura 3D, Figura 4). Esta redução dever-se-á principalmente ao decréscimo das áreas de aptidão média-alta, do presente para o futuro, sobretudo para o pior cenário, com perda substancial de habitat no centro do PI e norte de África, uma retração orientada para oeste, com um potencial aumento da fragmentação (RCP 8.5; Figura 3B e Figura 4).
A distribuição de C. ladanifer durante o LGM é suportada pelos estudos genéticos e evidências fósseis, apesar das limitações de evidências de pólen nesse período. Foram identificadas quatro linhagens intraespecíficas na esteva com base em marcadores moleculares (Quintela-Sabarís et al., 2011; Quintela-Sabarís et al., 2012):
(1) região do Rif,
(2) área Bética,
(3) litoral centro de Portugal
(4) leste do PI.
Esta espécie migrou para oeste a partir do refúgio oriental (3), para norte a partir do norte de África (1) e em leque a partir do refúgio central de Portugal (4), durante o aquecimento a partir do LGM, com um ritmo de propagação relativamente rápido a partir do Holocénico médio. Essas descobertas estão de acordo a modelação feita para o LGM (Figura 4), consistente com a hipótese dos dois refúgios revelados no leste e sul da PI, à beira-mar, outro no norte da África e o quarto no centro Portugal, também perto do mar. A influência oceânica pode ter desempenhado um papel protetor contra o clima mais agreste da última glaciação e acabou por ser responsável pela sobrevivência da espécie, como foi constatado num estudo com o medronheiro (Ribeiro et al., 2017).
CONCLUSÕES
As projeções de distribuição ao passado oferecidas pelos modelos são congruentes com duas abordagens independentes (registro fóssil e genética), corroborando a validade de nossa modelação sobre o efeito das mudanças passadas no clima na distribuição de C. ladanifer para compreender o futuro da espécie em cenários de mudança global. Esta espécie será dramaticamente afetada pelo aquecimento global, apesar da sua resiliência à seca e à temperatura.
Como foi observado noutras espécies mediterrâneas, a migração para o norte não será uma possibilidade no futuro (Almeida et al., 2022). Em vez disso, a espécie colapsará para oeste em direção à costa portuguesa (Figura 4). Prevê-se que a área desta espécie seja muito reduzida no futuro e as informações fornecidas por este trabalho podem ajudar a entender as consequências para outras espécies igualmente resistentes à seca nesta região. Os políticos devem ser pressionados para tomar medidas urgentes para mitigar a tendência do aquecimento global e para a conservação da biodiversidade nesta região, um cenário possível mesmo para as espécies termófilas do Mediterrâneo.
BIBLIOGRAFIA
Almeida, A.M., Martins, M.J., Campagnolo, M.L., Fernandez, P., Albuquerque, T., Gerassis, S., Gonçalves, J.C., Ribeiro, M.M., 2022. Prediction scenarios of past, present, and future environmental suitability for the Mediterranean species Arbutus unedo L. Scientific Reports 12, 84.
Almeida, A.M., Ribeiro, M.M., Ferreira, M.R., Roque, N., Quintela-Sabarís, C., Fernandez, P., 2023. Big data help to define climate change challenges for the typical Mediterranean species Cistus ladanifer L. Frontiers in Ecology and Evolution 11.
Buira, A., Fernández-Mazuecos, M., Aedo, C., Molina-Venegas, R., 2021. The contribution of the edaphic factor as a driver of recent plant diversification in a Mediterranean biodiversity hotspot. Journal of Ecology 109, 987-999.
Quintela-Sabarís, C., Ribeiro, M.M., Poncet, B., Costa, R., Castro-Fernández, D., Fraga, M.I., 2012. AFLP analysis of the pseudometallophyte Cistus ladanifer: comparison with cpSSRs and exploratory genome scan to investigate loci associated to soil variables. Plant and Soil 359, 397-413.
Quintela-Sabarís, C., Vendramin, G.G., Castro-Fernández, D., Isabel Fraga, M., 2011. Chloroplast DNA phylogeography of the shrub Cistus ladanifer L. (Cistaceae) in the highly diverse Western Mediterranean region. Plant Biology 13, 391-400.
Ribeiro, M.M., Piotti, A., Ricardo, A., Gaspar, D., Costa, R., Parducci, L., Vendramin, G.G., 2017. Genetic diversity and divergence at the Arbutus unedo L. (Ericaceae) westernmost distribution limit. PLoS One 12, e0175239.
A subespécie sulcatus da esteva: um táxon em risco?
Maria Margarida Ribeiro1 (mataide@ipcb.pt), Miguel R. Ferreira1, Alice M. Almeida1, Celestino Quintela-Sabarís2, Natália Roque1, Paulo Fernandez1
1Escola Superior Agrária do Instituto Politécnico de Castelo Branco, Castelo Branco, Portugal, 2Grupo de Ecoloxía Animal, Universidade de Vigo, Vigo, Espanha.
As alterações climáticas podem ser uma ameaça significativa para as espécies costeiras, pois ocupam locais restritos, em particular se existe afinidade com um tipo particular de costa, provocando a redução do seu habitat, obrigando-as a migrar ou extinguindo-as. A Cistus ladanifer subsp. sulcatus é uma planta endémica, que só ocorre no topo das falésias proeminentes da costa sudoeste de Portugal ou costa Vicentina. Este táxon é considerado uma prioridade para conservação e o impacto das alterações climáticas na sua distribuição é desconhecido. Utilizámos o Maxent para modelar a sua distribuição atual e futura e ultrapassar esta lacuna. Usámos diferentes Modelos Gerais de Circulação, dois períodos de tempo no futuro e dois cenários de aquecimento global. Os resultados sugerem uma contração moderada da área de distribuição no futuro, embora a sua extinção seja, também, um cenário possível. A proximidade às falésias do litoral é crucial para a ocorrência desta planta, mas estas formações não estão uniformemente distribuídas ao longo da costa, dificultando a migração da subespécie, que é inibida, também, pela sua fraca capacidade de dispersão. No futuro esta espécie permanecerá confinada ao sudoeste de Portugal, uma região onde ocorrem muitas outras plantas endémicas e outras ameaças, tais como a atividade humana, reforçando a necessidade da sua conservação.
A Cistus ladanifer subsp. sulcatus (Demoly) P. Monts é endémica de uma região caracterizada por condições ecológicas específicas e está inserida em diversas associações fitossociológicas. Este arbusto lenhoso, que pode atingir 200 cm, é morfologicamente semelhante à subespécie ladanifer, embora tenha a venação foliar mais marcada e uma estratégia ecofisiológica distinta. A taxonomia não está totalmente esclarecida e alguns autores consideraram-na uma espécie separada (Cistus palhinhae), no entanto, a subespécie sulcatus parece ser a classificação mais apropriada, com base em estudos de genética molecular (Carlier et al., 2008). A divergência genética da subespécie ladanifer foi, provavelmente, desencadeada pela sua adaptação às condições particulares, ambientais e edáficas, que se encontram no topo das falésias costeiras do sudoeste de Portugal (Figura 1).
Os matos são componentes intrínsecas dos ecossistemas Ibéricos, em particular nas paisagens pós-fogo, onde as espécies do género Cistus são frequentemente dominantes. A parte ocidental da bacia mediterrânica contém a maior parte destas espécies, incluindo a Cistus ladanifer L., nativa de Marrocos, Argélia, Sul de França e Ibéria. A esteva apresenta uma elevada diversidade intraespecífica e considerável diferenciação populacional. Tem três subespécies reconhecidas (africanus, ladanifer e sulcatus), cujas distribuições convergem no extremo sul da Península Ibérica, sugerindo que os refúgios nesta área podem ter sido cruciais para a sua história evolutiva.
Figura 1. Localização da área de estudo e representação espacial do conjunto de dados de presença. Os círculos vermelhos representam os 38 pontos de presença utilizados para produzir os modelos para o presente e as suas projeções futuras e os triângulos amarelos todos os pontos de presença, n= 64 (adaptado de Ferreira et al. (2021)).
Objetivos no projeto
Os modelos de distribuição de espécies ainda não permitem prever a velocidade das respostas às atuais condições climáticas, mas podem ajudar na preservação de linhagens únicas circunscritas a áreas muito restritas.
Neste estudo visámos (1) prever a atual distribuição de C. ladanifer subsp. sulcatus, identificando as variáveis ambientais que mais a influenciam; (2) projetar a sua distribuição para diferentes períodos futuros e avaliar as alterações de alcance ao longo do tempo; (3) analisar as implicações que podem surgir das restrições de dispersão inerentes à biologia desta planta estritamente endémica, discutindo os consequentes desafios de conservação.
MÉTODOS
Para projetar o modelo no futuro, foram utilizados cinco modelos gerais de circulação (GCMs): ACCESS1-0, BCC-CSM1-1, CCSM4, MIROC-ESM e MRI-CGCM3), utilizou-se a aplicação web GCM compareR, para a escolha dos GCMs. As variáveis bioclimáticas foram descarregadas com uma resolução de 30 segundos, a partir do Worldclim v1.4. A projeção futura foi feita para 2050 (média de 2041-2060) e 2070 (média de 2061-2080), para cada GCM, em dois cenários de aquecimento global, um menos gravoso (RCP 4.5) e outro mais gravoso (RCP 8.5). As variáveis Distância à Falésia e Composição Edáfica foram mantidas tal como estão no presente, uma vez que provavelmente permanecerão inalteradas. Considerando os 5 GCMs e 4 combinações de períodos futuros e RCPs, no total, foram produzidas 20 projeções futuras (Figura 2).
Produziram-se mapas de ausência/presença para a subespécie: habitats adequados e impróprios. Isso foi feito comparando duas situações: com e sem limitação de dispersão. Para a primeira, usámos o polígono convexo mínimo com um área-tampão de 2 km, recortado para uma distância costeira máxima de 7 km (polígono de limitação de dispersão). O polígono foi considerado o local além do qual a subespécie não se consegue dispersar.
Figura 2. Síntese gráfica dos métodos empregues no trabalho (adaptado de Ferreira et al. 2021).
RESULTADOS
Área de distribuição potencial atual
As variáveis ecológicas usadas mais relevantes foram a Sazonalidade da Precipitação e a Distância à Falésia, com mais de 80% do contributo percentual médio para o modelo. A modelação com o Maxent revelou uma clara diminuição da adequação do habitat com o aumento das distâncias às falésias. Por outro lado, a adequação tendeu a aumentar com a Sazonalidade da Precipitação, apresentando padrões opostos aos observados para a Temperatura Média do Trimestre Mais Seco e a Precipitação Anual. A variável Composição Edáfica teve a pior contribuição para o modelo.
O nicho ecológico da subespécie sulcatus está concentrado nas zonas costeiras do sudoeste de Portugal e o Cabo de São Vicente foi considerado o seu habitat de excelência. O modelo teve uma elevada precisão preditiva (teste AUC = 0,9832, perto do melhor valor de AUC = 1). As projeções para o futuro destacaram a linha costeira a sul do Cabo Sines como a área mais adequada e, em alguns casos (particularmente em 2070), o Parque Natural da Arrábida. O Cabo de São Vicente foi consistentemente selecionado como a área mais adequada, com as projeções a revelarem como a única região onde a planta poderá persistir no futuro.
Evolução futura da área geográfica
Combinando o mapa atual com as 20 projeções futuras foram observados dois padrões gerais: (1) a perda de habitat será mais intensa nas áreas mais afastadas da costa e (2) o ganho de habitat será mais efetivo entre a metade norte da distribuição da subespécie e o cabo de Sines e no Parque Natural da Arrábida. Não foram encontradas diferenças substanciais entre GCMs, exceto no caso do MRI-CGCM3, que revelou os piores cenários, com perdas de habitat entre 71,4% e 100% (Figura 3). No caso do RCP 8.5, apenas o BCC-CSM1-1 resultou na perda de habitat até 2050 (1,4%). A perda de habitat foi mais evidente para o RCP 4.5 (até 37,5% de toda a área atualmente adequada). Considerando o polígono de limitação da dispersão, a área adequada, no presente diminuiu 15% dos 280 pixéis adequados sem restrição. Como seria esperado, na projeção futura a área adequada tendeu a diminuir com limitação da dispersão (Figura 3).
Figura 3. Mudanças na área de distribuição entre os GCMs, períodos de tempo e cenários. As cores correspondem às categorias de mudança de habitat: Verde - habitat mantido, Vermelho - habitat perdido e Azul - habitat ganho. As figuras à esquerda correspondem ao cenário sem restrições, onde C. ladanifer subsp. sulcatus é capaz de se dispersar por todo o lado e à direita, existem limitações à dispersão, a área exclusiva onde pode estar presente, tanto atualmente como no futuro (adaptado de Ferreira et al. 2021).
CONCLUSÕES
Neste estudo mostrámos que as alterações climáticas podem restringir significativamente o habitat da C. ladanifer subsp. sulcatus, embora reduções moderadas pareçam ser mais plausíveis. Confirmámos a estreita afinidade que esta planta tem com as falésias metamórficas: o habitat mais adequado. Confinada por areias a norte e paisagens urbanas a sudeste, onde a influência atlântica é substituída pelo mar Mediterrânico, não é expectável uma expansão considerável da subespécie. Nesse sentido, as populações desta linhagem única de C. ladanifer devem ser vigiadas. As a políticas de conservação destinadas a este e outros taxa simpátricos, devem ser implementadas, visto ser a costa Vicentina um dos locais referenciados de biodiversidade de plantas na Península Ibérica.
BIBLIOGRAFIA
Carlier, J., Leitao, J., Fonseca, F., 2008. Population genetic structure of Cistus ladanifer L. (Cistaceae) and genetic differentiation from co-occurring Cistus species. Plant Species Biology 23, 141-151.
Ferreira, M.R., Almeida, A.M., Quintela-Sabarís, C., Roque, N., Fernandez, P., Ribeiro, M.M., 2021. The role of littoral cliffs in the niche delimitation on a microendemic plant facing climate change. PLoS One 16, e0258976.
Ensaio de proveniências da esteva para seleção e melhoramento genético
Maria Margarida Ribeiro (mataide@ipcb.pt)1, João Paulo Carneiro1, David Frazão2, Celestino Quintela-Sabarís3, Nuno Borralho4
1Escola Superior Agrária do Instituto Politécnico de Castelo Branco, Castelo Branco, Portugal; 2Centro de Biotecnologia Agrícola e Agroalimentar do Alentejo, Beja, Portugal; 3Grupo de Ecoloxía Animal, Universidade de Vigo, Vigo, Espanha; 4Instituto de Investigação da Floresta e Papel, Aveiro, Portugal
O sucessivo agravamento das condições climáticas (temperaturas mais altas, chuva concentrada em períodos mais curtos, seca estival alargada entre outros), edáficas (solos degradados pela agricultura intensiva e/ou fogos florestais/rurais) e sociais (abandono territorial) têm impactos negativos ambientais (libertação de CO2, perda de biodiversidade), sociais (insegurança) e económicos (perda de culturas e de rendimento).
As espécies endógenas bem-adaptadas ao território e a condições climáticas severas, poderão ser uma solução para recuperar e explorar áreas abandonadas e degradadas. A esteva (Cistus ladanifer L.) é uma dessas espécies, que consegue sobreviver à exposição solar elevada, à baixa disponibilidade de água e em solos pobres em nutrientes e/ou contaminados (Frazão et al. 2018).
Estudos recentes têm demonstrado o potencial económico da esteva. A biomassa pode ser fracionada em lenhosa, semilenhosa, herbácea e cápsulas. A biomassa lenhosa constitui uma das principais frações da esteva, predominante em estevais mais velhos (Frazão et al. 2023 e referências citadas), com valor para o setor energético ou para bio conversão (Alves-Ferreira et al. 2022). As cápsulas e sementes têm potencial para alimentação animal e humana (Frazão et al. 2022b; Rodrigues et al. 2021). A biomassa herbácea pode ser usada na alimentação de ruminantes (Guerreiro et al. 2016). A biomassa herbácea e semilenhosa - biomassa fotossintética - pode ser usada para a extração de óleos essenciais e a resina lábdano, que têm mercado potencial. A resina lábdano e extratos derivados são atualmente usados na perfumaria, mas a sua aplicação em produtos cosméticos, cosmacêuticos e farmacêuticos pode vir a ter valor económico (Frazão et al. 2022a).
Na sua área de ocorrência, por ser abundante, o cultivo da esteva não tem sido considerado, e também por o seu uso económico necessitar de ser estudado e divulgado. No entanto, o desmatamento realizado para reduzir o risco de incêndios e aumentar as pastagens, pode afetar a sua disponibilidade local, assim como o aquecimento global (Almeida et al. 2023). A presença de outras espécies nos estevais dificulta a possível colheita mecânica, que resultaria numa mistura de espécies vegetais, aumentando os custos de seleção de biomassa de interesse ou alterando a qualidade e o rendimento dos produtos obtidos. Além disso, o cultivo desta planta pode ter relevância em solos muito degradados e, também, nos contaminados com metais pesados, pela fito-extração de manganês e zinco ou fito-estabilização de arsénio, cobre, níquel e chumbo (Raimundo et al. 2018).